Entre 1º e 26 de abril, registros da doença na cidade subiram de 34 para 97. Especialistas apontam que parte da população ignora isolamento

 

Mesmo sendo a sexta região administrativa mais populosa do Distrito Federal, Águas Claras é a segunda em números absolutos de infectados pelo novo coronavírus. Segundo boletim da Secretaria de Saúde divulgado na noite desse domingo (26/04), são 97 pessoas com a Covid-19 e três mortos em decorrência da doença. Águas Claras só está atrás do Plano Piloto, que soma 207 casos.

 

Para especialistas, representantes de entidades e moradores, o crescimento de casos confirmados deve-se a diversos fatores, em especial ao fato de parte dos moradores da cidade não respeitar o isolamento. Basta sair às ruas para perceber pessoas fazendo exercícios em pontos comunitários, conversando nas praças ou o trânsito engarrafado.

De 1º até 26 de abril, os números subiram de 34 para 97 infectados, crescimento de 185%. A região administrativa tem, segundo dados mais recentes da Companhia de Planejamento do DF (Codeplan), 148,9 mil habitantes.

Três pessoas já morreram aqui. Mesmo assim, as pessoas não seguem as orientações de isolamento. Além disso, Águas Claras tem muitos prédios, elevadores… São espaços pequenos, com alta incidência de contaminação. É preciso ter todo cuidado, com álcool e máscara”, destaca o presidente da Associação de Moradores e Amigos de Águas Claras (Amaac), Román Dario Cuattrin.

Para ele, adotar o isolamento e as medidas de proteção seriam as melhores opções neste momento.

 

Contato e poder aquisitivo

O professor de epidemiologia da Universidade de Brasília (UnB) Wildo Araújo ressalta que a rede de contatos dos moradores de Águas Claras também é um fato a ser considerado no índice de contaminação. “São pessoas de classe média, classe média alta, que tiveram acesso a aeroportos, pessoas que viajaram. Tudo isso facilitou a contaminação num primeiro momento, porque a doença chegou pela classe média alta”, ressalta.

Para o especialista, o grande número de casos identificados do coronavírus também se deve ao maior acesso a planos de saúde e poder aquisitivo para a realização de testes. A terceira razão seria o ponto em comum com as outras pessoas ouvidas pela reportagem: o desrespeito ao distanciamento.

“Eu moro em Águas Claras e vejo que as pessoas agem como se nada estivesse acontecendo. Só a educação e o investimento na quarentena real podem efetivamente reduzir a curva”, alertou o especialista.

27ª vítima de coronavírus no Distrito Federal morava em Águas Claras. Conforme mostrou a Coluna Grande Angular, nesse domingo (26/04), a servidora pública aposentada Celina Xavier Gontijo, 63 anos, morreu após complicações em decorrência da doença. Em entrevista ao Metrópoles, Rebecca Gontijo, 33, filha da vítima, contestou a informação de que a mãe tivesse comorbidades. Ela afirmou que Celina se cuidava, respeitava o isolamento e “amava viver“.

 

A aposentada foi internada no Hospital das Forças Armadas (HFA) em 31 de março. No dia 1º de abril, precisou ser entubada e transferida para a unidade de terapia intensiva (UTI). Morreu no sábado (25/04).

A falta de cuidados para evitar a proliferação do coronavírus em Águas Claras é observada por Rebecca. “Moro lá e as pessoas andam como se nada estivesse acontecendo. O comércio está lotado e ninguém está de máscara”, enfatizou. Celina deixou três filhos e o marido.

Medidas diferenciadas

Devido ao crescimento no número de casos confirmados, o Governo do Distrito Federal tem voltado as atenções para Águas Claras. O governador Ibaneis Rocha (MDB) decidiu iniciar a testagem em massa na segunda região com maior quantidade de casos em números absolutos e no Plano Piloto, que está em primeiro lugar.

Além disso, o governador disse que pode retardar a retomada das atividades econômicas na cidade, caso os números não regridam.

Embora a previsão para abertura do comércio seja 3 de maio, a testagem em massa é que vai nortear o retorno das atividades em Águas Claras. “A população intensa em condomínios ajuda na contaminação. Se houver o registro de uma contaminação muito grande, a reabertura no comércio lá pode ser diferente”, sinalizou Ibaneis, em entrevista concedida nessa quarta-feira (22/04).

“Doença terrível”

Primeiro caso diagnosticado da Covid-19 em Águas Claras, o advogado Jean Pablo de Paiva Lopes descobriu a doença no dia 12 de março. Ele estava com um abscesso na perna e acreditava que a febre era por causa disso.

Começou a sentir, então, muito cansaço, sonolência e voltou ao hospital. “Era a terceira vez que ia ao Anchieta. Nas duas primeiras, achei que era a perna. Na terceira, fizeram o exame para coronavírus e deu positivo”, lembra.

O advogado ficou internado três dias na UTI, além dos dias de isolamento em casa. Com sete dias, a febre cessou e, após duas semanas, ele se sentia melhor. “Foi a doença que mais me deixou convalescido. É uma enfermidade terrível”, salientou.

 

O número de casos confirmados do novo coronavírus no Distrito Federal chegou a 1.253 na noite desse domingo. Houve 72 registros a mais em relação ao balanço divulgado ao meio-dia.

Fonte: Metrópoles